Querido(a) mentee,
Essa é uma história ao contrário. Neste texto, vou te contar como meus inúmeros sonhos frustrados e tentativas mal-sucedidas me levaram a conquistar algo inacreditável.
Aos 14 anos, meus olhos se encheram de lágrimas quando não vi meu nome na lista de aprovados do instituto federal da minha cidade. Para alguém que sempre teve sonhos grandes, uma rejeição como essa era o primeiro sinal de que meus planos não dariam certo (pelo menos era o que eu pensava). Nem nos meus sonhos mais impossíveis eu imaginaria que apenas 4 anos depois eu estaria me preparando para ir estudar com bolsa integral em uma das melhores universidades dos Estados Unidos.
Quando a decepção passou, ficou a sensação de que eu precisava fazer muito, muito mais se eu quisesse chegar onde sonhava. Essa rejeição me mostrou que ir muito bem na minha escola não era o suficiente, então comecei a estudar muito por fora. Ao mesmo tempo, tentei me manter firme para realizar um sonho que alimentava há mais de 5 anos: ir à UWC (United World Colleges).
A primeira rejeição da UWC foi muito dolorosa, pois me senti frustrando sonhos que nutria há muito tempo. Acho que a opção de dar errado nunca havia passado pela minha cabeça; eu tinha certeza que daria certo só pelo tanto que eu queria. Aprendi que só querer muito algo não é o suficiente para que dê certo. Aos poucos, superei e voltei a estudar. 2018 foi o ano em que eu mais estudei. Estudava na escola de manhã e no Descomplica (cursinho online acessível para o ENEM e vestibulares) das 14 às 22h. Fui rejeitada por algumas escolas internacionais e também recebi minha segunda rejeição da UWC. Dessa vez, não chorei nem fiquei triste. Tive só uma sensação de vazio quando percebi que o sonho nunca se tornaria realidade.
Por outro lado, 2018 foi o ano que me mostrou como eu poderia chegar longe se me esforçasse. Estudar tinha dado certo: recebi bolsa para estudar em um dos melhores colégios de Salvador, tinha tirado notas muito altas no ENEM, na UNICAMP e até passado na lista de treineiros da FUVEST. Finalmente, senti também que minhas tentativas de estudar fora finalmente começaram a dar certo: recebi minha primeira aceitação da LALA (Latin American Leadership Academy).
Ser aceita na LALA me deu motivação para continuar tentando. Passei minhas férias fazendo applications. Apliquei para o YYGS (Yale Young Global Scholars) mesmo achando que nunca seria aceita e para o SPCS (Stanford Pre-Collegiate Summer Institutes). Em um grupo, descobri que era possível ir fazer faculdade nos Estados Unidos com bolsa. Embora aquilo parecesse extremamente irreal pra mim e, no fundo, eu tivesse a sensação de que nunca conseguiria, decidi aplicar para o Prep Estudar Fora e para o Opportunity Funds EducationUSA. Fui rejeitada em ambos programas de mentoria na primeira etapa. Aquilo me doeu muito, mas eu encarei como um motivo para eu esquecer estudar fora na faculdade e focar na minha escola e em vestibulares.
Em fevereiro, eu embarquei para a minha primeira experiência internacional. Considero que ir para a LALA talvez tenha mudado todo o curso da minha vida. Eu estava rodeada de pessoas que iriam aplicar ou já haviam aplicado e, subitamente, aquilo passou a parecer tão real e palpável. Em conversas, descobri que passar em uma mentoria está longe de ser garantia de admissão em uma faculdade fora e que não passar também não é sinal de derrota. Ouvi sobre casos de pessoas que haviam sido negadas pelas mesmas mentorias que eu fui e que, mesmo assim, tinham entrado com bolsa em universidades incríveis.
Eu voltei pra Salvador energizada para passar a correr atrás de um sonho novo e intimidante. Mesmo que eu ainda tivesse minhas dúvidas de vez em quando, eu consegui um jeito de pagar pelas provas e tinha amigos que me ajudariam. Eu sabia que provavelmente abriria mão de passar em uma universidade brasileira que eu sonhei por anos para tentar um sonho arriscado, mas eventualmente entendi que eu precisava tentar e não podia desperdiçar aquela oportunidade.
O desânimo de não ter recebido bolsa para ir para o summer program de Stanford foi rapidamente substituído por felicidade quando passei com bolsa para o YYGS. Ir para o YYGS fez com que meus pais e a minha escola me apoiassem mais e também me deu muito mais vontade de aplicar.
Em abril, recebi a notícia de que havia sido escolhida para receber uma bolsa do Aplica! Prep, startup que ajuda jovens a aplicarem pra fora. Acho que, junto a ir pra LALA, esse foi o momento que mudou tudo. Mesmo que estivesse conseguindo me virar sozinha, ter ajuda na application facilitou muito o processo pra mim. As sessões do Aplica! eram como pequenas doses de apoio e encorajamento que me mantinham animada e seguindo em frente.
2019 foi um ano muito conturbado pra mim. Mudei de escola e passei a morar sozinha, tinha aulas todos os dias das 13:30 às 20:30, provas toda semana e agora fazia parte de uma sala muito forte academicamente. Eu me comparava aos meus amigos de application e me sentia completamente incapaz, ao mesmo tempo que olhava o quanto meus amigos estudavam para os vestibulares e me sentia horrível. Passei meses sem abrir os livros da escola, só fazia redações nas provas e faltava muito. Antes do SAT de outubro, faltei quase 3 semanas seguidas para estudar. Também me senti muito sozinha em diversos momentos, achei que estava fazendo tudo errado - às vezes, sentia que estava largando tudo para ir atrás de um sonho impossível.
Em janeiro, como eu já imaginava, não passei na USP e na UNICAMP e decidi começar física na UFSCar. Eu me senti muito mal por não passar, mas, quando cheguei em São Carlos, percebi que eu seria muito mais feliz aqui do que em São Paulo ou Campinas. É engraçado, mas eu fiquei feliz por não passar em algo que eu sonhei por anos! Entrei em uma república em São Carlos, conheci pessoas incríveis e confesso que até sinto um apertozinho no coração de ir embora - sei que seria muito feliz aqui também.
Quando eu recebi 15 rejections e waitlists em março desse ano, eu não conseguia olhar pra trás e me arrepender da decisão de aplicar. Aplicar me fez ter força para enfrentar meus medos e inseguranças e aprender a lidar com rejeições. Eu fiz amigos incríveis e aprendi como meus amigos e a minha família são mais do que essenciais para mim. Ao mesmo tempo, aprendi a lidar com a sensação de solidão e pressão. Sinto que hoje eu tenho um conhecimento muito mais vasto sobre quem sou e sobre meus objetivos que só foi possível por meio da minha experiência aplicando.
Em março, recebi a decisão das 20 universidades que apliquei. Tiveram dias que eu abri 4 rejections seguidas. Mesmo que eu estivesse muito feliz em São Carlos, as rejeições ainda doíam muito. Confesso que eu não chorei com nenhuma delas, mas sentia aquela sensação de vazio. No Ivy Day, minhas esperanças já praticamente não existiam. Quando abri Dartmouth College, tive uma sensação estranha. Eu não chorei, mas tive uma sensação de felicidade completa e genuína. Abri as outras rejections ainda muito feliz. Foram 13 rejections, 6 waitlists e 1 acceptance.
Às vezes, eu paro pra pensar que, se eu não tivesse aplicado para 1 dessas 20 universidades, eu provavelmente estaria me sentindo um grande fracasso agora por não ter passado em nada. Tudo o que sou e represento continuaria sendo especial, eu só não iria saber. No fundo, isso me ensinou que resultados (principalmente de processos tão aleatórios quanto application) nunca traduzem quem você é, o seu merecimento e o seu esforço. Resultado algum te faz ser mais ou menos incrível. Acho que hoje eu entendo que eu nunca deveria me sentir um fracasso por resultado algum, pois eles tão pouco definem sobre quem eu sou.
Essa é uma história ao contrário porque nenhum dos planos que eu tracei aos 14 deram certo, mas aqui estou eu: indo estudar em um lugar incrível e realizando um sonho que, por muito tempo, eu nem mesmo me permiti sonhar por considerar impossível. Sim, no final deu tudo certo, mas até lá foram muitas batalhas. Esse texto é para te mostrar, mentee, que por trás de cada “Congratulations!” existem inúmeros “We regret to inform you [...]”. Receber rejeições nunca deixa de doer, mas é preciso ter muita resiliência (coisa que se aprende só com a prática) para saber tirar o máximo delas ao buscar melhora em si.