Sophomore em Harvard College, o João Abdalla é nascido e criado na cidade do Rio de Janeiro, tem 20 anos e estudou no Colégio Militar do Rio de Janeiro. Interessado por política, ele se envolveu com simulações da ONU durante o ensino médio, trabalhou na campanha do deputado estadual do Renan Ferreirinha e estagiou no gabinete da ALERJ. O Abdalla está pensando em fazer major em Government ou Economics, é apaixonado por futebol e adora andar de bicicleta.

Como você decidiu ir estudar fora e como foi tornar essa ideia realidade?

Eu descobri a existência de faculdades legais dos Estados Unidos assistindo um episódio de Zack e Cody: Gêmeos a Bordo. Eles falavam sobre Yale, Harvard e outras faculdades e na época eu fui pesquisar no computador o que era e eu achei super maneiro, aquela possibilidade de viver fora era super interessante para mim. Eu fiquei com essa ideia na cabeça e até antes do ensino médio eu já tinha exemplos de pessoas que estudaram no meu colégio fazendo faculdade nos Estados Unidos. O Renan Ferreirinha passou quando eu estava terminando o meu sexto ano e outros alunos foram aprovados em Yale e em outras faculdades excelentes nos anos seguintes também. Conforme eu fui pesquisando sobre o processo e sobre as pessoas que passavam, eu percebi que era possível, que eu só precisava realmente entender o processo e me dedicar a isso. Desde o primeiro ano eu tinha muito claro para mim que o que eu queria era estudar fora e eu acho que em nenhum momento eu deixei isso de lado. Ao longo do ensino médio, eu fui dando muito valor às oportunidades de atividades extracurriculares e tentei me esforçar ao máximo tanto dentro quanto fora da sala de aula. Eu acho que foi assim que eu consegui pouco a pouco ir construindo o meu application para eu conseguir ser felizmente aceito no final.

Por que você acredita que foi aceito em tantas universidades e o que você acha que fez o teu application se destacar tanto?

Eu acho que é muito importante no application você ter algo em que se destaca. Ser uma pessoa com vários interesses e well-rounded é bem importante, mas ser bem apaixonado por uma coisa em específico e se dedicar bastante para ela é algo que é muito bem visto. Quando eu entrei no ensino médio, uma coisa que mudou completamente a minha vida, a minha maneira de interagir com os outros e me levou a fazer vários amigos que hoje são meus melhores amigos foi o meu envolvimento com simulações da ONU. Desde o primeiro ano eu fui envolvido com simulações, eu me juntei a outras pessoas da minha escola para criar uma simulação, a RioMUN e acabei tendo a oportunidade de simular na Harvard MUN por meio dos colégios militares. Além das simulações, eu recebi uma ajuda do Prep Estudar Fora que realmente me fez entender o processo em detalhes - coisas que não são super relacionadas ao ensino médio, como o que é uma boa carta de recomendação e como escrever uma boa essay. Eu acredito que muitas pessoas que estão aplicando tenham uma história legal a ser contada, só que o mais desafiador é você saber contar a sua história e saber lidar com o processo. Eu sou muito grato ao Prep pela ajuda que recebi e acho que hoje estão surgindo muitos projetos legais, como o próprio SuperMentor, para a galera que está aplicando que há um tempo era algo muito distante e difícil. Então se a gente for colocar no papel, acho que fatores que fizeram muita diferença foi a questão das simulações e o meu envolvimento com a campanha do Renan - que foi uma experiência que aprendi muito e que encaixou muito bem no meu perfil porque eu quero trabalhar com política no futuro. Minhas notas de provas foram boas mas não foram absurdas. Outra coisa que eu acho que me destacou também foram os subjects tests de US History e World History que eu fiz. Quando eu estava aplicando, uma coisa que eu ouvia era que eu deveria fazer o subjects test de chemistry, physics e Math II porque eram os mais fáceis pra Brasileiros, e os outros “não tem como fazer”. Eu questionei esse “não tem como fazer” porque eu acho que o application é como se fosse uma carteira de identidade que você tem e que você usa para se apresentar, só que os meus interesses não são matemática, não são química e física. Então eu fiz os subjects tests que eram realmente o que eu gostava.

Você enfrentou desafios ou dificuldades durante o application? Como foi para superá-los?

Eu acho que uma das partes do application que é mais difícil para brasileiros é a parte dos standardized tests. Eu fiz as provas várias vezes e mesmo que tenha gente que é muito boa fazendo prova, ainda é uma minoria quem consegue fazer uma vez e ir super bem ao ponto de não refazer. São provas muito difíceis, é uma lingua que a gente não fala fluentemente e por melhor que seja seu inglês você vai precisar estudar para a parte de inglês. Eu fiz o SAT reasoning 3 vezes até chegar numa nota que para mim foi decente. Eu acho que essa prova é difícil e o TOEFL também é bastante difícil. Em questão de estudos, se você tiver um material bom ao seu alcance, uns livros maneiros e até na questão de inglês mesmo, tentando “viver” o inglês no dia a dia, ouvir podcast e anotar as palavras que você não conhece, você vai acabar superando essa dificuldade e no final acho que vai dar tudo certo. É uma questão de dedicação: é uma parte chata do application mas dá para lidar bem.

Por que você escolheu Harvard?

Eu já tinha visitado a faculdade quando eu fui para a HMUN e eu decidi aplicar para lá, mas não era a minha dream college - era uma faculdade boa na lista de outras faculdades boas que eu estava aplicando. Harvard tem uma quantidade absurda de recursos a sua disposição, é uma faculdade com muito dinheiro e quando você vê as redes de suporte que você tem a sua disposição - bibliotecas, centros de pesquisa, laboratórios, professores absurdos - você vê o quanto isso faz a diferença. Isso está presente até nos detalhes sutis, como por exemplo a rede de advising ou o fato de eles sempre pagarem seu almoço com o seu peer advisor. Um outro ponto que realmente pesou muito na minha decisão foi a localização. Eu passei para outras faculdades que eu gostava muito também, mas o fato de Harvard estar localizada em Cambridge, que é uma cidadezinha do lado de Boston, é muito cômodo. Você consegue viver aquela sua vida de faculdade longe de cidade grande só que ao mesmo tempo você está a 15 minutos de uma cidade grande, então você acaba tendo tudo - é pegar a parte boa da localização de Princeton e juntar com a parte boa da localização de Columbia.

Como é a parte acadêmica de Harvard? É muito difícil, requer muito esforço e o ambiente acadêmico é muito competitivo?

Eu lembro que quando eu estava aplicando eu ficava lendo relatos de universidades seletivas no Quora de gente que roubava pen drive um do outro durante a aula para o outro tirar zero no trabalho, que deletavam coisa do computador e esse tipo de coisa. E cara, não é nem um pouco tão competitivo quanto eu esperava. É realmente muito mais colaborativo do que eu imaginava, tanto que uma das coisas que eu mais sinto saudade nesse semestre que a gente fez off campus é trabalhar com meus amigos, compartilhar minhas dúvidas com eles e trocar ideia sobre as aulas. Essa é uma das coisas mais legais sobre fazer faculdade nos Estados Unidos. Por outro lado, eu acho que estar em Harvard acaba sendo um pouco pesado. Não exatamente pela cobrança da faculdade, porque você tem aulas muito diferentes, aulas mais difíceis e outras mais fáceis e cada um escolhe sua rotina de aulas. É pesado porque as pessoas acabam se cobrando muito e porque todo mundo está em um momento muito frágil da vida em que estamos vivendo pela primeira vez longe dos nossos pais, vendo o mundo pelos nossos próprios olhos pela primeira vez e tomando todas as responsabilidades para nós mesmos. Você pode compartilhar as coisas com os seus amigos, mas você, no final das contas, é quem decide tudo o que você faz em relação a sua educação, então você acaba se cobrando um pouco mais. Não tem um clima competitivo no geral, mas as pessoas se cobram muito. É claro que disso decorrem algumas mental health issues, mas é algo que pela minha experiência a faculdade lida bem. Pelo que eu ouço, Harvard é uma faculdade que investe bastante dinheiro nessas redes de advising e de suporte de mental health no sistema de saúde que eles têm. Eu costumo dizer para as pessoas que é um lugar que você tem que pensar o tempo inteiro - sobre o que você está fazendo, suas aulas, seus amigos, seus objetivos futuros - porque o fato de você ter muitos recursos faz com que você tenha que fazer muitas decisões e isso é algo muito pesado na nossa cabeça. O que é muito bom é que você tem pessoas com quem você pode contar: você tem o seu academic advisor, a sua proctor que vive com você e seus amigos. Eu acho que Harvard é uma faculdade que investe nisso de uma maneira muito séria e que isso faz muita diferença. Uma coisa que eu também acho que é bem interessante em Harvard é o sistema das aulas. Eu não sei se é assim em outras faculdades, mas por exemplo, as aulas mais famosas como EC 10 (de economics) ou CS 50 (de computer science) você tem uma palestra duas ou três vezes por semana com um professor muito incrível e depois dessa palestra tem sections. As sections são onde a gente se reune em grupos menores para discutir as coisas em maiores detalhes e você acaba se conectando bastante com outros alunos e com o seu instrutor da section. Eu não fazia ideia que Harvard funcionava assim quando eu entrei, mas é uma coisa que funciona muito bem para mim e para os meus amigos. Existem aulas que não são tão grandes assim, então você não tem esses professores hiper famosos mas você tem professores muito bons também. Essas aulas são seminários, onde você tem um contato muito mais próximo e dá para aprofundar o assunto bastante. Uma outra coisa muito legal do programa acadêmico de Harvard são os freshman seminars. Eles pegam esses professores super famosos que estariam dando uma palestra para 500 alunos e colocam  em um grupo de 15 alunos para você ter aulas duas vezes por semana. E daí você está em constante contato com um professor que aparece na coluna do New York Times toda semana, é incrível. Eu tive um freshman seminar chamado ‘causas e consequências da desigualdade’ e meu professor era diretor do Departamento de Public Policy de Harvard, da Kennedy School. Ele passando tudo isso para a gente numa linguagem acessível é uma experiência muito legal. Um amigo meu teve freshman seminar com o Greg Mankiw, que é um economista super famoso, e ele convidou todo o grupo de alunos que estava no seminário para jantar com o Trump. Não era só eles e o Trump, era um jantar com umas 50 pessoas, mas mesmo assim é um jantar com o presidente dos Estados Unidos. Em EC 10, que é a aula que a gente tem de introdutório a economia, eles convidam sempre uns economistas super famosos para dar guest lectures para a gente. É impressionante a quantidade de gente super interessante que participa do campus e eu acho que a gente é muito privilegiado por isso.

Como é a parte de pessoas e de fazer amizades e estabelecer relações em Harvard? Há um estereótipo do estudante que você vai encontrar ou todo mundo é diferente?

As pessoas são muito diferentes lá e não tem esse estereótipo do aluno de Harvard, que é o cara chato competitivo que fica o dia inteiro estudando e que vai trabalhar com finance ou consulting depois. O meu grupo de amigos representa muito bem isso. O meu grupo principal de amigos é bem internacional - o meu roommate, por exemplo, tem 3 nacionalidades. Cada um tem uma história muito diferente a contar e as pessoas são muito interessantes de você trocar uma ideia e sentar durante o almoço e perguntar sobre o que ela se interessa, daí ela começa a te contar alguma coisa muito interessante que fez no ensino médio e o que ela pretende fazer na vida. É um lugar com pessoas muito carismáticas, pessoas muito abertas. Eu esperava um pouco mais de antipatia das pessoas de lá e eu acho que esse foi um fator de Harvard que realmente me surpreendeu - as pessoas serem tão abertas e tão comunicativas. Eu fiz muitos amigos e sou muito grato por isso - agora eu tenho um lugar para ficar em muitos países pelo mundo.

Como é a social life em Harvard?

Harvard não é uma das faculdades mais famosas por social life e não tem essa cultura de fraternidades que muitas faculdades dos Estados Unidos têm, mas uma coisa que acontece muito é que a vida social gira bastante em volta do sistema residencial da faculdade e das organizações dos estudantes. Por exemplo, a sociedade de brasileiros de Harvard tem mais ou menos 40 alunos só em graduação e a gente é bem ativo e é uma comunidade bastante unida. A sociedade foi até um dos motivos por eu ter escolhido Harvard, porque eles organizam coisas super legais como a Brazil Conference e quando eu passei vieram falar comigo muito prontamente para tirar minhas dúvidas. As organizações de alunos organizam festas, eventos com comida, coffee chats e eventos assim ao longo do ano. Têm muitas organizações culturais que fazem algo legal toda semana também, como os latinos e a organização de asiáticos. A parte de residential life é um tanto difícil de explicar, mas basicamente quando você é freshman você fica no Harvard Yard, que é a parte mais antiga do campus. Todos os freshman vivem juntos, em 12 ou 13 dormitórios espalhados em uma mesma área. Então as pessoas se conhecem muito fácil, você está sempre próximo das pessoas com quem você estuda e que entraram junto com você e é muito fácil de fazer amigos. Você encontra sempre alguém que está na mesma section que você, alguém que sentou do seu lado numa palestra e fica conversando ali mesmo (quando não está extremamente frio). É uma social life bem guiada por coisas residenciais e organizações de estudantes, mas o pessoal sempre aproveita também para conhecer a área da faculdade. Boston é uma cidade com bastante coisa e quando você é maior que 21 você pode ir em night clubs e tal. Eu pessoalmente acho que Cambridge é uma cidade muito legal de ser explorada - uma coisa que eu fazia era sair por aí andando de bicicleta com os meus amigos. Então no geral Harvard não é a faculdade com a social life mais agitada do mundo, mas ao mesmo tempo você está na maior cidade universitária dos Estados Unidos então oportunidade é o que não falta. Eu já fui para festas no MIT e na Boston University, por exemplo.